O
PROCESSO HABER-BOSCH
Um
dos grandes desafios da humanidade é criar soluções cada vez mais eficazes para
produção de alimentos em larga escala. Ao longo do tempo descobriu-se que as
plantas necessitam de certos alimentos para crescerem. Elas utilizam basicamente
de O2, H2 e CO2 presentes em quantidades
abundantes na agua do solo e no ar atmosférico. Além desses elementos as
plantas exigem uma porção mínima de outros elementos como N, P, K que também
são retirados do solo. Porém, muitos solos apresentam quantidades insuficientes
de N, P, K dificultando ou impedindo o crescimento saudável da planta. Eles se
tornam então os elementos limitantes. Se o solo não tiver uma quantidade mínima
de N, P, K a planta simplesmente não cresce.
Em
nosso planeta não há quantidades suficiente de terras para plantarmos alimentos
para todos. Na busca de uma solução muitos cientistas estudaram possiblidades
de enriquecer o solo, era preciso expandir a superfície fértil da terra,
aumentando a disponibilidade dos elementos limitantes.
Estes
pesquisadores descobriram que estes elementos limitantes deveriam estar em uma
forma biodisponível, ou seja em uma forma capaz de ser
absorvida pelas plantas, o N2 por exemplo. Embora haja muito N2
na atmosfera, ele se apresenta na forma de nitrogênio molecular onde não pode
ser aproveitado pelas plantas. Assim foram desenvolvidos os adubos ou
fertilizantes, produtos que normalmente contem KNO3 e Ca3(PO4)2.
Os
depósitos naturais de guanos e salitres surgiram como primeira solução. Guano é
um resíduo de fezes de aves marinhas que são depositadas ao longo de milhares
de anos formando verdadeiras ilhas na costa do Peru.
Já o salitre são minas de KNO3
existentes no norte do Chile, tais fontes foram intensamente exploradas na
segunda metade do século XIX, mas não durariam muito.
No
final do século XIX, cientistas renomados como William Crookes já alertavam que
essas fontes de fertilizantes não renováveis iriam se esgotar. Nesta época a
Inglaterra monopolizava o comércio desses produtos, por esses motivos a
pesquisa por alternativa de fertilizantes passa a ter um valor altamente
estratégico para outros países. Um deles é a Alemanha recém unificada, a
Alemanha estava extremamente preocupada em construir sua hegemonia tanto
política quanto econômica. Outro interesse da Alemanha pela pesquisa era o fato
dos nitratos entrarem na formulação dos explosivos.
Observando
que os raios apresentavam a combinação do N2 e O2 da
atmosfera procurou-se fazer o mesmo com altas correntes elétricas,
industrialmente, mas era um processo muito caro. É neste cenário que surge
Fritz Haber, o homem que realizou a síntese da amônia de maneira a produzir em
escala industrial a partir do N2 e H2 abundantemente
disponíveis. Essa reação química parece simples, mas não é. Transformar uma
molécula de N2 e de 3H2 em 2NH3 é tecnicamente
muito complexo porque necessita de altas pressões e temperaturas.
Ele
estudou tudo isso cuidadosamente, junto com a sua equipe construiu um
recipiente resistente a altas pressões, onde novas válvulas foram
desenvolvidas, vários catalisadores foram investigados e finalmente um sopro de
amônia escorreu em seu reator.
Ostwald,
Le Chatelier, Nernst e grandes cientistas da época tentaram realizar a síntese.
Todos sabiam que a reação precisava de altas pressões e temperaturas elevadas e
que catalisadores deveriam ser usados.
Trabalhando com a equação química
da formação de amônia,
Haber
sabia que a remoção de calor deveria favorecer a formação de amônia. Mas na
realidade Haber foi incapaz de detectar a formação de traços de amônia, sendo
que isso indicava que a velocidade de reação direta era extremamente lenta.
Haber também sabia que 4 volumes molar se tornavam 2 volumes molar nesta reação
direta o que tende a diminuir a pressão no recipiente. Ele incentivou essa
reação aplicando mais pressão no sistema para “espremer” a amônia. Isso
resultou em um fracasso. Mesmo sob centenas de atmosferas de pressão e
temperaturas baixas, ele foi incapaz de produzir um sopro de amônia, nem Haber
e nem a Alemanha tinham tempo de esperar uma reação tão lenta.
Haber
percebeu que a adição de calor acelera todas as reações, se não houvesse um
produto para interferir a reação, teria só um sentido. A presença do produto
amônia certamente não era o problema no inicio, de modo que uma temperatura
elevada poderia ser usada pra produzir amônia.
O
inimigo de Haber era a amônia em si, quando ela aumentava em quantidade, o
calor começava a favorecer a reação inversa, de volta para o nitrogênio e
hidrogênio até que um equilíbrio fosse atingido com apenas uma pequena
quantidade de amônia presente.
Se
só era possível produzir um pouco de amônia, Haber resolveu produzi-la
rapidamente e ele descobriu que o Ósmio e Urânio eram os catalisadores que
produziam o maior aumento de velocidade da reação. Com estes dados Haber foi
capaz de calcular que era possível atingir um compromisso com a velocidade de
reação e a concentração do produto na mistura de gases.
A
uma pressão de 200 atm e a uma temperatura de 600ºC, ele produziu 100 cm3
de amônia e quase um rendimento de 8%. Mas a velocidade da reação tornava o
processo comercialmente inviável.
O
trabalho de Haber teve o sucesso de unir ciência e tecnologia. Os interesses
científicos da academia se juntaram aos interesses comerciais da indústria
química que financiou seu trabalho. O uso do catalisador permitiu que sua
reação ocorresse em temperaturas e pressões muito elevadas, mas possíveis de
serem usadas na produção industrial e foi um trabalho em equipe.
O
processo de Haber foi levado à escala industrial pelo engenheiro Carl Bosch
onde ambos desenvolveram um método viável para a síntese da amônia. Haber
melhorou as condições da reação enquanto Bosch a adaptou para ser produzida em
escala industrial. Portanto a Alemanha poderia a partir da amônia fabricar seu
nitrato para fertilizar suas terras e produzir seus explosivos.
Isso
viabilizou a produção dessa substância tão importante. O processo de síntese de
amônia foi batizado de processo Haber-Bosch. Ele foi considerado tão importante
que o cientista recebeu o premio Nobel de química no ano de 1918
Os
fertilizantes fabricados neste modo proporcionaram um enorme avanço na
agricultura em grande escala e hoje bilhões de pessoas podem encontrar o que
comer graças ao trabalho de Fritz Haber. Sem duvida se não houvesse a produção
de amônia a produção agrícola seria muito menor, além disso, a amônia é muito
utilizada para a produção de explosivos, medicamentos, polímeros e muitos
outros compostos.
Além
de grande cientista, Haber era um nacionalista extremo e usou seu conhecimento
na produção de armas químicas onde milhares de pessoas morreram por isso.
Haber
entendia que como cientista era dever seu usar seu conhecimento para ajudar seu
país vencer a guerra. Einsten que era um grande amigo de Haber discordava dele
e mantinha uma postura pacifista.
A
Alemanha perde a guerra e Haber é acusado de criminoso de guerra e se exila.
Suas experiências com armas químicas e gases mortais revelam um paradoxo entre
o conhecimento e a ética.
Quando
Haber retorna a Alemanha, seu instituto de físico-química em Berlin se torna o
centro mais avançado do mundo neste campo, mas seu país está muito diferente.
Com
a ascensão do nazismo em 1933, todos os funcionários públicos de origem judaica
são demitidos e passam a ser perseguidos. Haber era judeu e acaba morrendo em um
exílio na Suíça em 1934 extremamente amargurado. Seu país a quem Haber tanto se
dedicou acabou por renegar seu conhecimento como igual.
Portanto
compreender como se dão as reações químicas é fundamental para podermos
controlá-las e obter os resultados que desejamos. Muito dos trabalhos atuais
dos cientistas conhecidos como químicos são dedicados a essa compreensão. A
aplicação do conhecimento científico ainda é imprevisível. Hoje a utilização
intensa dos fertilizantes na agricultura e o próprio modelo de agricultura
baseado nos fertilizantes são causas de preocupação pelo impacto ambiental que
promovem.
Derrubadas
de florestas, esgotamento e poluição do solo e da água doce, como evitar esses
impactos?
Como
manter uma produção sustentável desses alimentos em grande escala para uma
população que não para de crescer?
Encontrar
essas respostas voltou a ser um dos nossos grandes desafios. A ciência é viva e
evolui para tentar compreender melhor a natureza e ninguém sabe o que futuro
fará com o que sabemos hoje, afinal tudo se transforma, até mesmo o
conhecimento.
Referência:
ARAÚJO, M.C. ; BALDINATO, J.O. A síntese de amônia: uma proposta de estudo histórico para a formação de professores de química vinculada ao Prêmio Nobel de Fritz Haber. Revista História da Ciência e Ensino: Construindo Interfaces. São Paulo, Volume 11, pg. 91-129, 2015.
Disponível em: file:///C:/Users/Seven/Downloads/nobel%20(2).pdf
Resumo elaborado por: Renato Ceconi Leone Moreira